4.8.09

O ano que vem

 
   Agora, só no ano que vem. O paletó empapado de suor e os quadris com o peso do amontoado de anos que aconteceram. Já é quarta-feira de cinzas.
A gravata acordará com o bustiê purpurinado. A mulher ainda estará na cama, fingindo dormir, quando a porta abrir e ele chegar. O cansaço chama a saudade berrando “O carnaval acabou!”.
   Por entre serpentinas e confetes, ouvia-se em sussurros “Agora, só no ano que vem.”. No armário, as camisas sociais importadas aproveitavam o último dia de repouso. Cabisbaixo, andando vagarosamente, chutou uma latinha de cerveja. Já tinha gente limpando tudo, mas nada mudava o sentimento de vazio dele.
   O homem conseguia imaginar seu chefe dizendo “É, foi inesquecível até nos esquecermos.”. Um aperto no peito fazia ecoar “O carnaval acabou ou ou...”. A mulher dele dirá que é hora de voltar à vida.
   No entanto, sozinho na sua arquibancada de pensamentos, ele discordará “O carnaval é o mais vivo que a vida fica”. Agora, só ano que vem. E quando chega é sempre bom, é o melhor, é inesquecível.
   Então ele ergue a cabeça, o sorriso brota em seu rosto. A melhor festa da sua vida estava por vir no próximo ano.
   E o carnaval acabou.

[05/12/08]

Nenhum comentário:

Postar um comentário